Inverter Grid-Following vs. Grid-Forming,BSS , Compensadores Síncronos (SynCons), FACTS, as
possíveis soluções a os problemas de
instabilidade do Sistema Elétrico do Brasil
ENG. ARMANDO CAVERO
MIRANDA
1. Inversores Grid-Following (Seguidores de Rede - a maioria atual):
Funcionam como
"seguidores": Eles
precisam "sentir" uma rede elétrica estável e forte (com tensão e
frequência bem definidas) para poderem injetar energia.
O Problema: Em um sistema com muita geração solar,
se houver um a perturbação (ex: queda de um gerador grande), a rede pode ficar
fraca. Vários inversores grid-following tentando se reconectar ao mesmo tempo
podem dessincronizar e piorar a instabilidade, podendo levar a um colapso
(apagão).
2. Inversores Grid-Forming (Formadores de Rede - a
solução):
Funcionam como
"fontes": Eles
não seguem a rede; eles criam
uma rede elétrica
estável. Eles geram os sinais de tensão e frequência de referência,
comportando-se como geradores síncronos tradicionais.
A
Solução: Eles fornecem inércia sintética e suporte de frequência, ajudando
aamortecer as oscilações e a manter a estabilidade da rede, mesmo com
altapenetração de fontes intermitentes como a solar.
Por
que os Grid-Forming não são amplamente vendidos/adotados?
As razões são uma combinação de fatores técnicos, econômicos e de mercado:
1. Custo Significativamente Maior:
A tecnologia
grid-forming é mais complexa, requer componentes de maior qualidade e
algoritmos de controle sofisticados. Atualmente, o custo de um inversor
grid-forming pode ser 20% a 50% mais alto que um grid-following equivalente. Para
o consumidor residencial ou comercial, que prioriza o retorno financeiro
rápido, o inversor mais barato é quase sempre a escolha.
2. Falta de Regulamentação e Normas Técnicas Obrigatórias:
O Brasil ainda está no processo de atualizar suas normas (como o Módulo de Procedimentos de Distribuição - MPD da ANEEL) para exigir que novos inversores conectados à rede tenham capacidades grid-forming.
Enquanto não for uma obrigação legal, as concessionárias de energia e os fabricantes têm poucos incentivos para migrar para uma tecnologia mais cara. A resolução normativa 1.059/2023 da ANEEL foi um primeiro passo, mas as exigências ainda estão em evolução.
3.Imaturidade do Mercado e da Cadeia de Suprimentos:
A grande maioria
dos fabricantes, especialmente os chineses que dominam o mercado de baixo
custo, focou-se em produzir em massa inversores grid-following para atender a
demanda global.
A cadeia de
fornecimento, instalação e manutenção está muito mais adaptada aos modelos
grid-following. A transição para uma nova tecnologia leva tempo.
4.Falta de Conscientização e Demanda do Consumidor:
O consumidor
final, e até muitos instaladores, não entendem a diferença técnica. O foco é no
preço, na potência e na garantia. Poucos compram um inversor pensando na
"estabilidade do sistema elétrico nacional". Sem demanda, a ofusca.
5.Desafios Técnicos de Integração em Larga Escala:
Embora sejam a
solução, integrar milhares de fontes grid-forming em uma rede complexa como a
brasileira apresenta seus próprios desafios de controle coordenação. As
concessionárias e o Operador Nacional do Sistema (ONS) ainda estão estudando os
melhores protocolos para isso.
O Futuro é
Grid-Forming
Os inversores grid-forming são sim a solução técnica para o problema da instabilidade causada pela energia solar exponencial no Brasil.
A
transição já começou, mas é um processo que levará alguns anos. Ela será
impulsionada por:
·
Regulamentação: A ANEEL e o ONS forçando a adoção através de normas.
·
Redução de Custos: Conforme a tecnologia amadurece e é produzida em massa, o
custo extra diminuirá.
·
Necessidade do Sistema: Conforme os problemas de instabilidade
se tornarem mais frequentes e caros, a pressão por uma solução definitiva
aumentará.
Enquanto isso, o Brasil está em uma "zona de risco", onde o crescimento desregulado de uma tecnologia (grid-following) está a ultrapassar a capacidade do sistema de absorvê-la com segurança. A adoção em massa dos inversores grid-forming não é uma opção unica, mas uma necessidade urgente para a segurança energética do país.
BSS
(Battery Storage Systems) ou Sistemas de Armazenamento em Bateria
A adoção de BSS,
especialmente quando combinada com inversores grid-forming, não é apenas uma solução, mas potencialmente *a* solução mais completa para o problema. Vamos analisar
os impactos técnicos, econômicos e normais.
Impactos
Técnicos: A Revolução da Estabilidade
Os BSS
elevam a solução para um outro patamar, agindo como um "amortecedor"
de alta potência e velocidade para o sistema elétrico.
- Estabilidade de
Frequência Instantânea: As baterias respondem a variações
de frequência em milissegundos, muito mais rápido que uma
usina térmica (minutos). Elas podem injetar (descarregar) ou absorver
(carregar) potência ativa instantaneamente para travar a frequência,
evitando os "cavalos de pau" que levam a desligamentos em
cascata.
- Controle de Tensão e
Potência Reativa: Inversores modernos acoplados a BSS podem fornecer suporte de
tensão local, injetando ou consumindo potência reativa. Isso resolve
problemas de sobretensão nas redes de distribuição em horários de alta
geração solar, um dos grandes desafios atuais.
- "Firmeza" da
Geração Solar: Os
BSS permitem que a energia solar intermitente se comporte como uma fonte
"firme". Eles armazenam o excesso de geração do meio-dia e o
disponibilizam no horário de pico (entre 18h-21h), que no Brasil é
justamente quando o sol já se pôs. Isso reduz drasticamente a necessidade
de ligar termelétricas caras e poluentes.
- Suporte a Ilhamento
Inteligente: Com um sistema grid-forming + BSS, uma
subestação ou um bairro inteiro com alta penetração solar pode se isolar
com segurança da rede principal durante um apagão, mantendo o fornecimento
de energia local até a rede nacional ser restabelecida.
Impactos Econômicos: O Grande Desafio e Oportunidade
Este é o
ponto mais crítico e onde as barreiras são maiores.
- Custo de Investimento
(CAPEX): Esta
é a principal barreira. Um sistema de baterias em larga escala ainda tem
um custo inicial muito elevado. O preço por kWh armazenado caiu
drasticamente (caiu mais de 80% na última década), mas ainda representa um
investimento significativo para residências e, em escala utility, para o
sistema.
- Modelos de Negócio e
Receita: Para
ser viável, o BSS precisa de múltiplas fontes de receita ("value
stacking"). No Brasil, os principais seriam:
- Serviços Anciliares: Pagamento pelo
ONS para fornecer regulação de frequência (como já fazem as
termelétricas, mas de forma muito mais eficiente).
- Posto de Carga: Armazenar
energia barata (solar ou da base) e vender no horário de ponta, quando a
energia é mais cara.
- Adiamento de
Investimentos em Rede: As concessionárias podem instalar
BSS em pontos críticos da rede para evitar ou adiar investimentos
bilionários em novos cabos, subestações e linhas de transmissão.
- Backup de Energia para
consumidores: Um
valor agregado para indústrias e comércios que não podem ter sua
interrompida.
3.
Viabilidade Financeira: A economia do BSS já é viável em nichos
específicos (ex: indústrias com demanda contratada muito alta, onde uma bateria
pode reduzir o puxamento da rede no horário de ponta, gerando enorme economia
na fatura). Para o mercado massivo, a viabilidade depende de:
o Leilões Específicos: O governo criar
leilões para comprar capacidade de armazenamento, como já faz com energia.
o Regulamentação Clara: Definir como os BSS
serão remunerados pelos serviços que prestam ao sistema.
Impactos nas Normas e Regulamentação: O Campo a Ser Desbravado
O
Brasil está atrasado na criação de um marco regulatório específico para
armazenamento.
1.
Enquadramento Legal: O armazenamento não é claramente
definido na legislação como geração, transmissão ou distribuição. É um
"novo ator". A ANEEL precisa criar uma definição clara para o Armazenamento Independente de Energia,
permitindo que ele participe do mercado e preste serviços.
2.
Acesso aos Mercados: É preciso modificar as regras do
mercado de energia (MCCE) e dos leilões para permitir que o BSS participe e
seja remunerado de forma justa. Hoje, é muito difícil para uma bateria vender
energia em um leitor de longo prazo, pois ela não é uma "fonte
geradora", e sim uma "flexibilizadora" do sistema.
3.
Normas Técnicas de Conexão: A ANEEL teria que
expandir o Módulo de Procedimentos de Distribuição (MPD) para incluir
requisitos específicos de segurança, desempenho e interoperabilidade para
sistemas de armazenamento conectados à rede, especialmente os que operam em
modo grid-forming.
4.
Tributação: A carga tributária sobre as baterias no Brasil é um
obstáculo. Criar um regime tributário diferenciado (como já houve para painéis
solares) seria um grande impulso.
A Combinação Ideal
Grid-Forming
+ BSS = Sistema Elétrico Resiliente e com Alta Penetração de Renováveis.
- Os inversores
grid-forming fornecem a "inteligência" e o
comportamento de fonte estável.
- Os BSS fornecem
o "musculo" – a energia instantânea para sustentar essa
estabilidade.
A adoção de
BSS no Brasil resolveria não apenas o problema de instabilidade causado pela
solar, mas também:
- Aumentaria a segurança
energética.
- Reduziria o custo
marginal do sistema (deslocando termelétricas).
- Permitiria uma
transição energética mais rápida e segura.
Aqui está um panorama das principais soluções técnicas e tecnologias emergentes:
1. Soluções
em Larga Escala (Transmissão e Geração)
a)
Compensadores Síncronos (SynCons)
- O que é: São máquinas
síncronas (como os geradores de uma usina) que giram em vazio, sem gerar
energia ativa. Sua função é fornecer inércia rotational e potência
reativa para a rede.
- Como resolve: A inércia é a
resistência natural das grandes massas girantes às mudanças de frequência.
Com o desligamento de termelétricas (que são inerentemente síncronas),
perde-se inércia. Os SynCons repõem essa inércia, amortecendo as variações
de frequência e aumentando a resiliência a distúrbios.
- Status no Mundo: Amplamente
utilizados em países com alta penetração de renováveis, como a Dinamarca e
partes da Austrália. No Brasil, já está em discussão a instalação de
SynCons em subestações chave.
b) FACTS
(Sistemas de Transmissão em Corrente Alternada Flexíveis)
- O que é: Dispositivos
eletrônicos de potência usados em redes de transmissão para controlar
parâmetros como tensão, impedância e ângulo de fase em tempo real.
Exemplos: STATCOM, SVC, UPFC.
- Como resolve: Eles estabilizam
a tensão, aumentam a capacidade de transferência de energia das linhas
existentes e suprimem oscilações de potência, permitindo um controle mais
fino e rápido do fluxo de energia.
- Status no Brasil: O ONS já opera
com alguns dispositivos FACTS no sistema de transmissão nacional para
otimizar o fluxo de energia, especialmente do Nordeste para o Sudeste.
c) HVDC
(Corrente Contínua em Alta Tensão) e VSC-HVDC
- O que é: Tecnologia de
transmissão em corrente contínua para longas distâncias. A versão mais
moderna, VSC-HVDC (Voltage Source Converter), é especialmente valiosa.
- Como resolve: O VSC-HVDC não só
transmite energia eficientemente, mas também pode estabilizar a rede CA à
qual está conectado, fornecendo suporte de tensão e frequência, e até
"cortando" e "reiniciando" ilhas da rede em caso de
colapso. Pode ser uma "firewall" contra a propagação de falhas.
- Status no Brasil: O Brasil já
possui linhas HVDC clássicas (como a de Itaipu). A adoção de VSC-HVDC é o
próximo passo natural para novos projetos, como a integração de parques
eólicos offshore.
2. Soluções
em Média e Baixa Tensão (Distribuição e Geração Distribuída)
a)
Gerenciamento Ativo de Rede (ARD - Active Network Management)
- O que é: Um sistema de
software e hardware que monitora e controla a rede de distribuição em
tempo real, coordenando todos os recursos conectados a ela (geração
distribuída, baterias, carregadores de VE, cargas controláveis).
- Como resolve: Em vez de
investir pesado em reforços de rede (cabos mais grossos, novos
transformadores), o ARD pode, por exemplo, ordenar a redução momentânea da
potência de inversores solares em um trecho com sobretensão ou acionar
baterias locais para injetar potência reativa. É a
"digitalização" da operação da distribuição.
- Status no Mundo: Reino Unido e
Alemanha são líderes. No Brasil, algumas concessionárias começam projetos
piloto.
b) Bancos
de Capacitores e Reatores Chaveados a Estado Sólido (SSC - Solid-State
Switching)
- O que é: A versão moderna
e ultrarrápida dos bancos de capacitores tradicionais. Usam semicondutores
(como IGBTs) para ligar/desligar em milissegundos.
- Como resolve: Fornecem
compensação reativa de forma extremamente precisa e rápida, estabilizando
a tensão contra flutuações causadas por nuvens passando sobre usinas
solares ou pela partida de grandes motores.
c)
Proteções Adaptativas e Digitalizadas
- O que é: Sistemas de
proteção (relés) que podem modificar seus ajustes automaticamente de
acordo com o estado da rede.
- Como resolve: Em uma rede com
fluxos bidirecionais (devido à GD), os ajustes de proteção fixos podem
causar desligamentos indevidos. As proteções adaptativas reconfiguram-se
dinamicamente, melhorando a seletividade e confiabilidade.
3.
Tecnologias Emergentes e Conceitos Avançados
a)
Inversores Híbridos (Grid-Forming + Grid-Following)
- O que é: Inversores que
podem alternar dinamicamente entre os modos de operação. Normalmente
operam como grid-following, mas, ao detectar uma fraqueza na rede, assumem
o controle como grid-forming para estabilizá-la.
- Status: Tecnologia de
ponta já disponível em alguns fabricantes líderes. É um meio-termo para
uma transição suave.
b)
Microredes e Ilhamento Controlado
- O que é: A criação de
"ilhas" energéticas autônomas (um bairro, um campus industrial)
que podem se desconectar intencionalmente da rede principal durante um
apagão e se sustentar com sua geração local e baterias.
- Como resolve: Impede que os
problemas da rede nacional se propaguem para áreas críticas, e pode até
ajudar na restauração do sistema maior depois do colapso.
c)
Plataformas de Agregacao e VPPs (Virtual Power Plants)
- O que é: Uma plataforma
digital que agrega milhares de recursos de energia distribuídos (painéis
solares, baterias residenciais, ar-condicionados, carros elétricos) e os
opera como se fosse uma única usina de energia flexível.
- Como resolve: Um VPP pode ser
despachado pelo ONS para fornecer os mesmos serviços ancillares que uma
grande usina, mas de forma distribuída e mais resiliente. É a
"democratização" dos serviços do sistema.
d)
Inteligência Artificial e Análise Preditiva
- O que é: Uso de AI/ML para
prever geração solar e eólica, prever falhas na rede, e otimizar o
despacho de todos os recursos.
- Como resolve: A incerteza da
geração renovável é um dos grandes causadores de instabilidade. A AI reduz
essa incerteza, permitindo que o operador tome ações preventivas.
Conclusão para o Brasil: A Visão Sistêmica
Não existe
uma "bala de prata". A solução para o Brasil será um pacote
integrado de tecnologias, regulamentação e gestão:
- Curto Prazo: Focar na regulamentação
que exija inversores grid-forming para novos sistemas e criar
um marco legal para o armazenamento.
- Médio Prazo: Implementar
programas de Gerenciamento Ativo de Rede (ARD) pelas
concessionárias e incentivar a formação de VPPs para
agregar a GD.
- Longo Prazo: Investir em
ativos de inércia síncrona (SynCons) e em linhas VSC-HVDC para
consolidar a rede do futuro.
O problema
da instabilidade é complexo, mas o conjunto de soluções técnicas já existe. O
desafio brasileiro agora é menos de engenharia pura e mais de governança,
regulação e velocidade de implementação para acompanhar o ritmo
explosivo da transição energética em curso.
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